19 setembro, 2010

Perdendo Tempo com o Tempo

Se existe um fato que há alguns anos vem me incomodando é a questão do tempo, ou melhor, da passagem do tempo. Eu me lembro de quando comecei a trabalhar como recepcionista, esse era o termo da época, naquelas feiras gigantescas no pavilhão de feiras do Parque Anhembi. Uma amiga havia sido contratada por uma empresa automobilística para o tal Salão do Automóvel, havia uma vaga para a seleção, ela me chamou, fiz a entrevista, fui selecionada e quando percebi, estava lá em pé no tal stand, vestida com roupas, calçados e acessórios que eram mais do que modernos, eram a vanguarda. Cabeleireiro e maquiador à disposição e aquele exercício pleno de vaidade de ser admirada. O melhor de tudo era o pagamento por dez dias de trabalho, das duas da tarde às dez da noite. Recebi em uma semana o suficiente para três mensalidades da faculdade. Nessa época eu fazia faculdade pela manhã e trabalhava à tarde na loja da Varig da Avenida São Luiz, aqui em São Paulo e por ter estado em alguns plantões tive direito há vários dias de folga. Foi perfeito, tudo se encaixou e eu, claro, feliz da vida. Mas bastou o primeiro dia da feira para eu descobrir que o tempo estava contra mim. A coisa era pessoal. Não, não que não houvesse tempo suficiente, pelo contrário. O tempo não passava. Eu olhava no relógio e via lá, três horas e cinco minutos. Meia hora depois eu olhava novamente e lá estava; tres horas e dez minutos. O tempo simplesmente não passava. Era uma tortura até chegar a tão sonhada dez da noite, porque aquilo podia ser muito glamoroso mas se a hora não passa você quer fugir, se esconder no banheiro, qualquer coisa que tire você dali. Eu sei que estudava, trabalhava, namorava, viajava quase todos os finais de semana. Cinema, festa, discoteca, lanchonete, restaurantes, shoppings e sempre, sempre havia aquelas horas de conversas com a amiga, naqueles papos intermináveis em que a gente não sabe de onde vem tanto assunto. Hoje, tenho a impressão de que a minha hora de sessenta minutos ...tem só quarenta. Gente, estou falando sério. Olho no relógio e são duas e quarenta. Tenho que ligar para alguém as três e meia. Tenho cinquenta minutos, ótimo, vou terminar esse texto, colocar água na minha plantinha, anotar um recadinho, grudá-lo em algum lugar e pronto. Olho no relógio. O quê???? São tres e cinqüenta. Acabou, perdi a hora. A atrasada aqui vai ligar e vai ouvir que a pessoa com quem precisava muito falar já saiu e só volta amanhã. Mas como só amanhã? Ainda são quatro horas... Mas, educadamente a pessoa do outro lado da linha me explica que o sujeito com quem preciso conversar, tem uma reunião no prédio ao lado e não vai dar tempo de voltar. “Tenta no celular, se for rápida ele te atende antes de entrar no elevador.” Alguém está roubando o meu tempo. Estou aqui, concentrada escrevendo quando alguém dá uma batidinha na porta e entra. É uma garota. Uma moça. Alta, bonita, longos cachos cor de mel, boca molhada de gloss, olhos contornados por delineador, uma imensa bolsa à tiracolo com um macaquinho pendurado no fecho e fazendo o papel da tiara, óculos de aviador, igual a um que meu namoradinho usava lá no final dos anos setenta. Ela olha prá mim e diz: “Mami, eu já vou. Te ligo quando chegar lá, tá?” Ahn? ... desculpe, o quê...? Ah, filha, por favor, fala outra vez por que eu não ouvi, estava distraída. Tá bom querida, quem vai levar mesmo? E quem vai buscar? Tá certo, vai com Deus, toma cuidado, qualquer coisa me ligaaaaaa...só quem ouviu a ultima frase foi só a porta do elevador. Pois é, era minha filha. Minha filha, minha biju? Não pode ser, minha bijú é aquela coisinha no meu colo, ali, no porta-retrato.

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